A apresentação da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2025 com possível redução na meta fiscal, a votação de vetos presidenciais a decisões parlamentares e o trâmite do projeto que recria o seguro DPVAT e, no bojo, altera o arcabouço fiscal colocam o Congresso no foco do mercado nesta virada de quinzena de agenda mais fraca de indicadores domésticos, mas exposta a uma turbulência financeira “importada”.
O risco de o Federal Reserve (Fed), o banco central americano, adiar o corte de juro para o segundo semestre – e em intensidade menor que a esperada -, ante surpresas inflacionárias, incentiva a reprecificação de ativos no mundo inteiro e poderá minar as condições financeiras que inspiram otimismo com a atividade econômica brasileira.
Após atravessar boa parte de 2023 e início de 2024 em território negativo sinalizando contração, o Indicador de Condições Financeiras (ICF) do Bradesco migrou para território positivo no início de abril, acenando expansão ou, no mínimo, neutralidade – classificação que aponta crescimento econômico potencial estimado entre 1,5% e 2% este ano.
Essa sinalização pode mudar, porém, a toque de caixa, a depender da reação do Fed à inflação ao consumidor que, em março, superou expectativas pelo terceiro mês seguido.
O indicador, divulgado na quarta-feira, 10 de abril, alcançou 3,5% em 12 meses, distanciando-se ainda mais da meta de 2%. A inflação ao produtor, que saiu na quinta, desacelerou e acalmou os mercados, mas sem eliminar a tensão instalada na véspera.
Na quarta, os juros dos títulos do Tesouro americano dispararam, reprisando a trajetória – ainda que não a intensidade – observada em 2023, quando, entre outubro e novembro, o prazo de 10 anos, benchmark da renda fixa global, atingiu 5%, o maior nível desde 2007. Os negócios avançam ao final da semana com juro entre 4,5% e 4,6%.
Lá atrás, a forte alta dos Treasuries – acompanhada por dólar forte e petróleo também – refletiu insegurança quanto a duração do aperto monetário empreendido pelo Fed, em meio ao agravamento de riscos geopolíticos com a eclosão da guerra Israel-Hamas.
Nos meses seguintes, a desinflação nos EUA e sinais de economia forte arrefeceram incertezas, favorecendo a transição das condições financeiras para território expansionista. Neste início de segundo trimestre, porém, as incertezas são renovadas e, a persistir esse cenário, poderão abortar a melhora do ICF.
Indicador que capta o comportamento de duas dúzias de variáveis que antecipam movimentos cíclicos da atividade econômica. Entre elas: taxa de juro no Brasil e no exterior, moedas, índices de ações, risco-país e commodities.
Myriã Bast, superintendente do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco, explicou ao NeoFeed que o ICF está sob a influência positiva dos índices acionários que afetam o resultado geral com defasagem de meses.
“Neste momento, os índices replicam, no ICF, valorizações alcançadas, sobretudo, no segundo semestre de 2023”, explica a economista que aponta o movimento dos Treasuries como “um risco no radar”.
Crédito como alavanca do PIB
Entretanto, favorecem o ICF, segundo Bast, os preços das commodities, não tão negativos quanto estiveram em 2023; a ajustes moderados do risco-país; e o juro que no Brasil recua há meses e assim deve prosseguir, enquanto no exterior, embora sem queda consumada, apresenta estabilidade e com perspectiva de baixa nos EUA e na Europa.
“Essas condições tornam o ambiente mais positivo para o ano”, avalia a economista para quem as reformas promovidas pelo governo e chanceladas pelo Congresso ao longo do tempo também reforçam expectativas promissoras, inclusive, para o PIB do ano que o Bradesco vê em expansão de 2%.
O Marco de Garantias e a Lei de Falências, em trânsito no Senado, são exemplos dessas medidas positivas. “Elas têm apelo institucional e respaldam as instituições financeiras em suas operações”, afirma Bast que também vê na atuação do BNDES junto a pequenas e médias empresas uma iniciativa que pode ter resultados favoráveis.
Na sua visão, além da queda na inadimplência, colabora para o incremento das operações, a dupla ancoragem do crédito representada por maior demanda e maior disposição das instituições a emprestar.
Sinal de que o governo faz aposta semelhante é a intensa mobilização de ministérios para restabelecer o crédito como alavanca de crescimento – tese historicamente defendida pelo PT. Com o envolvimento direto, inclusive, do presidente Lula, as pastas da Fazenda, Desenvolvimento Social e Trabalho se debruçam sobre medidas voltadas ao financiamento de microempreendedores e renegociação de dívidas.
O programa FGTS Futuro entrou em operação na segunda-feira, 8 de abril, e prevê o uso do FGTS de recebimento futuro como garantia na compra de imóveis por família de baixa renda. Em audiência pública está a proposta da Fazenda para aplicação de títulos de capitalização também como garantia de empréstimos.
Ajuda adicional para potencializar o crédito estará ativo, até o fim do ano, o compartilhamento de redes e estruturas entre a Caixa e os Correios com o objetivo de facilitar o acesso da população a serviços financeiros e fiscais. Uma parceria de gigantes que não deixa dúvidas sobre as intenções do governo.