O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, foi mais cuidadoso na sexta-feira, 24 de maio, ao analisar a política fiscal brasileira durante participação em evento do FGV Ibre, no Rio de Janeiro. Mas admitiu que o aumento da expectativa de inflação é “notícia ruim” para o BC.
Em vez de fazer críticas diretas à piora do quadro fiscal conduzido pelo governo federal, que tem levado o mercado a prever a desancoragem da inflação, Campos Neto preferiu dar “recados” sobre a situação fiscal brasileira durante a primeira parte de sua apresentação, quando mostrou gráficos e fez comentários sobre a situação da economia global.
“Inflação alta continua no topo da lista de riscos para a economia global”, disse Campos Neto, que fez a palestra de abertura do X Seminário Anual de Política Monetária, promovido pelo Centro de Estudos Monetários (CEM) do FGV Ibre.
“Os BCs precisam passar uma mensagem de que se o fiscal não ajudar, fica difícil executar a tarefa de controlar a inflação”, acrescentou.
Há um mês, ao participar de reunião com investidores em Washington (EUA) após o governo federal anunciar que adiaria para 2025 a meta de zerar o déficit fiscal, Campos Neto deixou claro que o BC poderia reduzir o ritmo de cortes na Selic diante do aumento das incertezas. O que de fato ocorreu.
Numa decisão dividida, com voto de minerva do próprio Campos Neto, o Conselho de Política Monetária (Copom) do BC decidiu, por 5 votos a 4, reduzir a taxa Selic em 0,25 ponto percentual, após seis reuniões seguidas com redução unânime de 0,50 pp.
O presidente do BC, no entanto, não se furtou a comentar a piora recente da situação fiscal do Brasil ao analisar, na sequência, a situação da economia do País.
“As expectativas de inflação têm sido bem ruins para a gente”, reconheceu, afirmando que elas estavam paradas para 2025, em torno de 3,5%, mas começaram a subir “por causa dessas mudanças recentes”, insinuando que se referia à decisão do governo de zerar o déficit só no ano que vem.
Na sequência, porém, alinhou vários fatores para essa mudança de expectativa de inflação. “Tem um tema de política fiscal junto com o tema externo e também de credibilidade do Banco Central”, disse. Segundo ele, essa tendência de alta da inflação deve impactar em 2025 nas taxas mais longas.
A previsão de crescimento do PIB do País em 2024 anunciada por Campos Neto está em 1,9%, abaixo da previsão do mercado, de 2,1%, embora essa projeção ainda não leva em conta os efeitos das enchentes do Rio Grande do Sul.
Por enquanto, diz Campos Neto, o BC estima um impacto de 6,5% no índice do PIB e de 12% no do agronegócio. A implicação das cheias gaúchas de 8,6% do IPCA foi citado como um dos impulsionadores da inflação.
“Os preços dos alimentos podem ficar um pouco mais altos em 2025 por causa do Rio Grande do Sul”, afirmou.
Campos Neto disse que o BC está acompanhado as projeções de quanto custará a reconstrução do estado do Rio Grande do Sul, lembrando que algumas simulações indicam um impacto de até 2% do PIB. “Isso vai influenciar o quadro fiscal na frente”, advertiu.